Sabe qual é o principal problema dos seres humanos? Exatamente isso: somos muito humanos. Seres cheios de exigências – tanto positivas como negativas. E esses desejos e repulsas muitas vezes se contradizem entre si.
Duas pesquisas recentes, conduzidas pelos institutos YouGov e ConsenSys, trouxeram à luz dados preciosos em relação a como os consumidores estão lidando com temas como privacidade, web 3.0, metaverso, criptomoedas, NFTs e outros temas bem atuais.
Vamos começar pela pesquisa do YouGov, que analisou as atitudes do consumidor em relação à privacidade e a questões sociais mais amplas em publicidade digital no Reino Unido.
O dado mais interessante do estudo apontou uma enorme disparidade. Por um lado, um terço dos consumidores expressou desejo por receber anúncios cada vez mais personalizados. Em outras palavras, querem ser tratados como pessoas reais, cujos interesses e necessidades são levados em conta. Por outro, apenas 6% estão dispostos a compartilhar os dados adicionais necessários para poderem receber anúncios altamente personalizados.
A disparidade é grande demais para ser desprezada. As empresas precisam urgentemente encarar de frente a questão do alinhamento entre as expectativas do consumidor e a utilização de seus dados pelas marcas para fins de marketing.
Outros dados também são preocupantes.
– 52% dos consumidores revogaram o consentimento que haviam dado anteriormente às marcas, com uma grande porcentagem, 56%, apontando como o principal motivo o que podemos traduzir por assédio, ou seja, as marcas estão aborrecendo o consumidor com mensagens irrelevantes ou sendo intrusivas.
– Além disso, 41% acreditam que não viram nenhuma melhora em sua experiência online desde que a GDPR, a LGPD europeia, foi introduzida em 2018.
Todas essas descobertas deixam bem clara uma coisa: o cenário das preferências do consumidor é bem mais complexo do que se pensava. Por exemplo, apenas 33% dos entrevistados concordam que os anúncios online são mais relevantes do que os offline.
Esse dado pode surpreender muita gente, porque a sabedoria convencional sempre concluiu que a publicidade digital oferece segmentação e personalização significativamente melhores. Mas não me surpreende. Tenho pregado – no deserto?
Às vezes até parece que sim – que usar esse ou aquele canal não é suficiente para aperfeiçoar a experiência do cliente. É necessário usar as metodologias corretas de ciência/engenharia de dados para construir confiança, promover transparência, respeitar a privacidade e ser capazes de oferecer experiências significativas que preencham a lacuna entre o marketing e as expectativas dos clientes.
A outra pesquisa que citamos foi conduzida pela ConsenSys e seu escopo é bem mais amplo, tanto em termos geográficos, pois abrangeu 15 países, inclusive o Brasil, como em relação ao conteúdo, uma vez que buscou descobrir o que os usuários entendem por Web 3.0, considerando que esse entendimento em si tem potencial para encaminhar soluções para temas como privacidade, identidade e propriedade digital.
Em relação a esse último tema, o estudo trouxe um dado que precisa ser analisado com mais cuidado, pois parece apontar na direção oposta, quando se observam os objetivos de marketing das empresas e as expectativas e necessidades dos consumidores.
O fato é que a maioria absoluta dos usuários (62%) sente que não está sendo recompensada adequadamente em relação ao que contribui na internet. Inclusive em relação aos dados fornecidos, que irão aperfeiçoar os planos de marketing.
A solução, portanto, seria simples: “show me the money”. E isso sequer é uma coisa nova. Os programas de fidelidade estão por aí há mais de 40 anos trabalhando exatamente a partir desta premissa: troque seus dados por prêmios (em última instância, por dinheiro). É necessário tão somente fazer os ajustes finos, construindo aquela confiança de que falamos anteriormente.
O estudo da ConsenSys corrobora o do YouGov, demonstrando que as preocupações com a privacidade de dados são proeminentes.
– 83% dos entrevistados priorizam a privacidade de dados,
– 70% acreditam que devem compartilhar os lucros que as empresas obtêm de seus dados e
– 79% desejam maior controle sobre suas identidades online.
Essas descobertas enfatizam a importância de as empresas ajudarem as pessoas a entender como as novas tecnologias podem dar a elas mais propriedade de sua identidade e propriedade na internet, bem como capacitar os usuários com maiores garantias de privacidade e uma participação nos lucros que as empresas atualmente obtêm por meio das atividades dos usuários na web.
Nessa direção, a conclusão do estudo é muito interesse, pois os autores veem uma oportunidade de adotarmos uma mentalidade de “construtores” em vez de simples “usuários”, a partir da qual os consumidores se sintam aptos para resolverem os problemas que cercam as questões de propriedade na web, identidade, privacidade e monetização. Em outras palavras, se sintam seguros para compartilhar seus dados, sabendo que receberão em troca não apenas anúncios mais personalizados, mas benefícios reais.
Uma boa notícia: o estudo da ConsenSys – que pode ser baixado aqui – aponta algumas discrepâncias em relação às regiões do mundo. E, nessa direção, o Brasil está em um grupo, junto com os países do Sudeste Asiático, da África e da América do Sul, que apresentam as atitudes mais positivas em relação a temas como cripto e web 3.0.
Da mesma forma, nesse grupo, o estudo identificou associações mais fortes com conceitos como futuro do dinheiro, propriedade digital e alternativas ao ecossistema financeiro tradicional.
Em nosso próximo artigo, vamos colocar o Brasil definitivamente no centro dessa discussão, a partir da análise dos dados trazidos à luz pelo mais recente estudo IAB/Nielsen que identifica um ecossistema centrado na privacidade cada vez mais forte e influente. Vocês estão atentos, por exemplo, a fenômenos como Data Clean Rooms e democratização dos dados?
Até lá.
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